+55(19)3493-9220 | (19)3493-5576 | (19)3493-4429 | WhatsApp: (19) 99798-2389 contato@petmed.com.br

Por Pauline Machado

Assim como nós, humanos, os animais também sentem dor, com a diferença de que, para identificar a dor em cães e gatos, o desafio é um pouco maior, uma vez que esses animais muitas vezes escondem seu desconforto instintivamente. Portanto, é fundamental que os familiares estejam atentos aos sinais sutis que podem indicar que eles estão sofrendo, e neste contexto, a observação cuidadosa e a compreensão do comportamento habitual de cada animal são essenciais para identificar a dor precocemente.

Para este assunto que envolve várias nuances, conversamos com exclusividade com o Médico Veterinário Álvaro José Chávez Silva, que dedica seu tempo e mantém sua rotina de estudos focada na dor crônica dos animais.

Álvaro é Doutor em Anestesiologia com ênfase em dor crônica pela Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC-BA; Mestre em clínica e cirurgia com ênfase em anestesiologia pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM-RS,  e segue seus estudos com as especializações em andamento em Comportamento Animal pelo Instituto de Saúde e Psicologia Animal – INSPA e em Fisioterapia animal pelo Instituto Brasileiro de Recursos Avançados – IBRA.

Acompanhe a entrevista que está super completa e aproveite para compartilhar com seus amigos e familiares.

Pet Med – O que caracteriza a dor crônica em cães e gatos, e como ela se diferencia da dor aguda?

Álvaro José Chávez Silva – Se pensarmos na dor, desde o ponto de vista da evolução ou da sua importância biológica, ela tem um propósito, uma função: a de preservar a vida, nos alertando sobre uma lesão existente, a fim de protegermos esta parte do corpo que se encontra lesionada e vulnerável, evitando assim, maiores lesões, enquanto o corpo faz a sua função de retornar a lesão à normalidade, devolvendo não só o aspecto de saudável, mas a sua funcionalidade. Assim, quando há uma ferida, por exemplo, na pele, esta área do corpo encontra-se sensível e dolorosa. Uma vez cicatrizada, o normal seria que a dor fosse embora junto com a lesão. No entanto, quando a lesão dura muito tempo em cicatrizar, quando a presença da dor persiste além do tempo de cura ou cicatrização da ferida, quando há evidência de lesão estrutural significativa de nervos, ou até quando não há uma evidência de lesão, mas existe presença de dor, muito provavelmente, encontramo-nos diante de uma condição dolorosa crônica. 

Desta forma, a dor crônica caracteriza-se por estar presente por longo tempo, por não ter uma função biológica de proteção da lesão, como é o caso da dor aguda, por envolver alterações mais profundas do sistema nervoso que perpetuam e acentuam a percepção da dor, mesmo na ausência de dano tecidual real. Além, disso, caracteriza-se por ter uma resposta limitada aos tratamentos convencionais, como aos anti-inflamatórios, assim como por contribuir com o estado mental dos animais, alterando a qualidade do sono, gerando ansiedade, agressividade, isolamento, depressão, perda de peso, angústia, estresse crônico, etc. 

Dito de outra forma, a dor aguda serve como sinal de existência de dano tecidual real, gerando comportamentos de alerta e de proteção para preservação da vida, bem como da recuperação do animal, ao passo que a dor crônica persiste para além do tempo normal de cicatrização, muitas vezes perde sua função protetora inicial e pode se tornar uma condição patológica em si mesma, levando a sofrimento, disfunção e redução da qualidade de vida do animal.

Pet Med – Como a dor crônica se manifesta em cães e gatos, e por que muitas vezes passa despercebida?

Álvaro José Chávez Silva – Nós humanos temos, quase sempre, a capacidade de expressarmos nossos sentimentos e pensamentos de forma oral, ao sentirmos fome, sede, sono, cansaço e até mesmo dor. Já os animais, por carecerem de capacidade de autorrelato, não conseguem nos dizer como se sentem, onde e quanto doi. Logo, cabe a nós, familiares, pais e mães de pets, veterinários, terapeutas, treinadores etc., identificar, localizar, quantificar, tratar, avaliar e reavaliar a presença de dor nos animais, de acordo com as nossas atribuições e capacidades. 

A dor crônica, além do mais, é uma experiência individual, influenciada por diversos fatores internos e externos, por tanto, cada indivíduo pode vivenciá-la de formas diferentes dada suas circunstâncias de vida, experiências passadas, traumáticas, estado de saúde geral, fatores genéticos, alimentícios etc…, tendo assim, múltiplas formas da dor crônica aparecer e manifestar-se. No entanto, podemos dizer de forma geral, que a dor crônica pode-se observar por meio de mudanças físicas e do comportamento que impactam aspectos da vida dos nossos pets de formas insuspeitadas, como alteração do estado mental e de humor, padrões de descanso e sono, de alimentação, hidratação, eliminação, atividade física, socialização, conduzindo a ansiedade, depressão e estresse, sendo este último, um fator contribuinte relevante para o aparecimento de outras condições clínicas, que poderiam ser interpretadas como independentes da dor crônica.

Desta forma, não apenas a ampla diversidade e sutileza de possíveis manifestações de dor crônica nos nossos pets, mas a normalização ou associação de alguns destes sinais ao envelhecimento natural deles, tornam a identificação e tratamento pertinente da dor crônica muito desafiadora. Também, assumir que tais comportamentos são apenas normais e naturais naqueles pets com personalidades mais distantes, solitários, retraídos, tímidos e esquivos, faz com que tais sinais sejam passados por alto e não levados em consideração. É importante salientar que, é esperado que alguns cães e gatos tenham uma tendência por ocultar comportamentos associados à dor, por serem descendentes evolutivos de animais ferais que, na natureza, eram predadores, mas também presas. Diante disso, torna-se importante tentar desenvolver um olhar sensível e atento com os nossos pets, para assim buscar ajuda ou assistência de profissionais com preparo técnico adequado.

Pet Med – Quais sinais clínicos e comportamentais mais sutis podem indicar que um animal está com dor crônica?

 A observação e o conhecimento atento, próximo e sensível aos nossos pets nos permite identificar ou ao menos suspeitar de que algo não está de acordo com o normal neles. Ao levar nossos pets ao veterinário, e quando conversarmos com ele/a, estaremos oferecendo informação valiosa que pode não ser percebida durante a consulta, mas que faz grande diferença na identificação de dor crônica. Os sinais clínicos que podem ser observados e aos que podemos estar atentos são: perda de peso corporal a expensas da massa muscular, perda do brilho e a densidade da pelagem, perda de áreas específicas de pelagem por lambido excessivo, claudicação, mudanças sutis no jeito em que caminham, dificuldade ou relutância em subir ou descer escadas, camas e sofás, postura arqueada o encurvada, relutância a esticar-se completamente, deitar-se exclusivamente de um lado, para aliviar a região dolorida, dificuldade em levantar-se ou deitar-se, diminuição ou perda do apetite.

Já os sinais comportamentais plausíveis de serem observados são alterações do comportamento normal ou conhecido dos nossos pets, bem como aumento ou diminuição excessivo de comportamentos normais, isto é, diminuição do investimento em atividades cotidianas que antigamente geravam muita alegria, isolamento, busca reduzida da companhia de humanos ou outros animais, busca incrementada de atenção por parte dos tutores, expressões faciais de angústia, reação de evitação ou agressão ao toque, vocalizações, embora menos frequente que nos casos de dor aguda, tremores espontâneos na pele, diminuição dos hábitos de higiene, especialmente em gatos, eliminação de xixi e cocô em lugares errados ou fora da caixa, constipação por evitar adotar a postura de defecação ou por dificuldade de acessar o lugar certo para fazer as deposições.

Estes sinais, podem facilmente serem associados a outras causas, que não condições dolorosas crônicas.

Pet Med – Como é feita a avaliação da dor crônica em pets? Existem escalas ou protocolos específicos para isso?

Álvaro José Chávez Silva – Ao percebermos que a dor crônica não é apenas um sinal da presença de uma lesão, como no caso da dor aguda, e sim uma doença em si mesma, com diferentes formas de manifestar-se, causada por muitas condições de diferentes naturezas, como traumas, câncer, quimioterapia, diabetes etc., é importante uma anamnese e um exame físico detalhado. 

Mas, não somente fazer uma avaliação do que pode ser visto diretamente no momento da consulta clínica ou até mesmo pelos exames complementares, como os de sangue, ultrassom, raios-X etc…, mas, sim, uma avaliação inicial detalhada da vida do pet, para além da consulta. Ter informações sobre se ele faz atividades físicas diárias, alimentação, condições pré-existentes, padrões de sono, mudanças de comportamento social, desempenho cognitivo, mudanças na sua treinabilidade etc…

Seguidamente, é realizada a avaliação física, observando a marcha espontânea, quando possível, além da avaliação de todos os sistemas orgânicos, cardiorrespiratório, digestivo, nervoso, osteomuscular, com especial ênfase na mobilidade dos membros e articulações e a sensibilidade dolorosa. 

A indicação de exames complementares é, por vezes, uma importante ferramenta na comprovação da presença de condições dolorosas crônicas. No entanto, além da disponibilidade e os custos econômicos de alguns destes, os exames complementares podem ir até um determinado ponto como ferramenta diagnóstica, e a ausência de sinais claros de dor com tais exames, não são necessariamente uma comprovação da ausência de dor nos nossos animais. Todavia, a identificação da dor crônica pode ser subjetiva e estar sujeita à interpretação do veterinário devido à incapacidade de comunicação verbal dos pets, a variações individuais na expressão da dor, à influência do ambiente, à interpretação humana e à natureza multifacetada da dor crônica, que além de componentes físicos, envolve componentes emocionais e comportamentais.

Felizmente, já existem ferramentas que auxiliam na redução da margem de erro na identificação de dor crônica, como escalas que atribuem um peso numérico a diferentes fatores físicos, emocionais e comportamentais, como Escala Facial Felina (FGS), especificamente para gatos, avalia expressões faciais sutis associadas à dor aguda e crônica; Escala de Dor Musculoesquelética da Universidade da Carolina do Norte (NCSU-CSM), focada na dor musculoesquelética em cães; Teste de Osteoartrite da Universidade de Montreal (MOAT), especificamente para avaliar a dor da osteoartrite em cães e a Escala de Dor da Universidade de Melbourne (UMPS), uma escala mais abrangente que avalia vários parâmetros comportamentais. Ao utilizar estas ferramentas e abordagens de forma combinada, é possível reduzir significativamente a subjetividade e aumentar a precisão na interpretação da dor crônica em cães e gatos, permitindo um manejo mais eficaz e uma melhor qualidade de vida para os animais afetados.

Pet Med – Por que os gatos têm maior tendência a esconder a dor, e como isso impacta o diagnóstico? E como demonstram estar sentindo dores?

Álvaro José Chávez Silva – Gatos são magníficos pets, com uma natureza comportamental muitas vezes incompreendida, por serem vistos como pequenos cães, porém mais solitários e independentes – um erro frequente, sustentado pela visão histórica a eles atribuída. É importante reconhecer as diferenças entre cães e gatos, uma vez que, para além de serem extremamente lindos, são animais com ancestrais evolutivos muito diferentes. Isto dita muito dos seus comportamentos, incluindo a forma em que expressam a dor, muito relacionada aos seus instintos de sobrevivência. 

Na vida silvestre, os ancestrais evolutivos dos gatos eram predadores, mas também presa e ao serem animais menos sociáveis e não terem uma vida em matilha, as demonstrações de vulnerabilidade ou fraqueza podiam significar uma ameaça à vida, sendo assim necessário adotar posturas mais estoicas diante de lesões ou dor. Esse instinto de autopreservação é profundamente enraizado no repertório comportamental do gato doméstico. Somado a isto, sinais de dor podem passar despercebidos pela menor oportunidade de observação de comportamentos dos gatos, pois momentos de maior atividade acontecem durante períodos noturnos, em que os tutores dormem. Também, os gatos têm uma média de 12 a 16 horas de sono por dia, tendo ainda menor chance de expressarem comportamentos associados à dor de forma a serem vistos pelos tutores.

Os sinais de dor em gatos podem ser muito mais sutis e mais difíceis de serem identificados em comparação com os cães, que muitas vezes vocalizam (choram, gemem, latem) ou mancam de forma mais evidente quando estão com dor aguda. Os gatos tendem a expressar dor através de mudanças comportamentais mais discretas, com tendências a tornarem-se mais reclusos, esconder-se, terem menor interação social, menor engajamento em brincadeiras, menos saltos, maior tempo de sono, diminuição da higiene, a autolimpeza ou lambedura excessiva numa área específica, associada ou não ao local de dor, diminuição ou perda de apetite, desenvolvimento de seletividade alimentar. Podem também adotar posturas curvadas, andar rígido. Um dos principais meios de observar desconforto e dor em gatos, é por meio da avaliação da expressão facial, onde orelhas ligeiramente rodadas e olhos semifechados podem ser observados, assim como, testa franzida, focinho e vibrissas tensas e apertadas, cabeça baixa à altura das costas. É frequente deparar-se com gatos que desenvolvem sensibilidade aumentada ao toque e alterações nos hábitos de eliminação, recusando-se a usar a caixa de areia ou a área escolhida para tal finalidade.

Pet Med – E nos cães? Como eles demonstram ou escondem os sinais de dor?

Álvaro José Chávez Silva – Já nos cães, sinais de demonstração de dor são mais perceptíveis, pela sua natureza corporal e facial mais expressiva, podendo ser evidenciados por comportamentos de vocalização como ganidos, choros, uivos, alterações posturais como claudicação ou rigidez na marcha, deitar-se ou sentar-se apenas usando um lado para aliviar a pressão e dor na região acometida, colocar a cabeça baixa, diminuição ou perda de apetite e hidratação, letargia ou aumento do número de horas de sono, desenvolvimento de reações protetivas, evitativas ou até agressivas ao toque na área dolorosa, redução do entusiasmo por atividades físicas como brincadeiras, passeios ou outras atividades pelas que antes mostrava interesse e dificuldade em deitar-se ou levantar-se. Alguns cães podem lamber excessivamente a região dolorosa, levando à perda da pelagem naquela região, e mudanças no humor, tornando-se mais ansiosos, sensíveis aos sons, irritadiços e deprimidos. Apesar de serem naturalmente mais expressivos que os gatos, certos cães, podem ainda, por instinto, procurar ocultar sinais de fraqueza ou vulnerabilidade. Este comportamento pode ser mais evidente em cães de temperamento reservado ou em situações de estresse. Isto, indubitavelmente leva à supressão dos sinais de dor. Outros cães podem mascarar a dor, empregando outros grupos musculares como compensação e forma de adaptação, mantendo assim uma aparência funcional, que dissimula os sinais de dor aos tutores. Ainda, há cães que, por tentar agradar aos tutores, fazem esforços por manter as atividades em que são engajados, mesmo com dor, suprimindo sinais de desconforto nas sessões de interação. Ainda, não é estranho que sinais sutis de dor sejam confundidos com o processo natural do envelhecimento ou interpretados como atitudes “preguiçosas” pelos tutores, assim pequenas alterações na rotina diária ou interação social podem passar despercebidas. 

Pet Med – Qual a importância de abordar a dor crônica precocemente, mesmo em casos leves ou sem sinais aparentes?

Álvaro José Chávez Silva – Ainda sobre as diferenças entre a dor aguda e crônica, uma vez que a dor aguda cumpriu a sua função de manter protegida a área acometida, para evitar lesões adicionais, esta some gradativamente, até o retorno da sensibilidade à normalidade, ao passo que a dor crônica persiste para além da resolução da lesão dos tecidos, tornando-se cada vez mais “inteligente”. A dor crônica vale-se da capacidade do sistema nervoso de alterar sua estrutura e função em resposta à experiência persistente da dor, por meio de um fenômeno conhecido como neuroplasticidade. Assim, o sistema nervoso passa por uma série de mudanças mal adaptativas que contribuem para a manutenção e intensificação da dor, mesmo após a lesão inicial ter cicatrizado. 

Quanto mais tempo passa, maiores e mais complexas mudanças acontecem no sistema nervoso, tanto periférica quanto centralmente, afetando não apenas o componente sensorial – a sensação física de desconforto, mas também estruturas nervosas associadas ao humor, memória, processamento das emoções, levando os nossos pets a experienciar estados emocionais negativos, em detrimento da sua qualidade de vida. Consequentemente, quanto mais tempo passa a dor sem ser tratada e mais mudanças estruturais acontecem no sistema nervoso, maior será o desafio de encontrar estratégias terapêuticas eficientes que contribuam à redução da dor nos nossos pets.

Pet Med – Que tipos de doenças estão mais associadas à dor crônica em cães e gatos, especialmente em animais mais velhos?

Álvaro José Chávez Silva – A dor crônica pode ser classificada, segundo sua origem, em três tipos, nociceptiva – aquela que resulta da ativação de receptores de dor devido a um estímulo nocivo ou a uma lesão tecidual real ou potencial; neuropática – aquela que acontece devido a uma lesão ou disfunção de nervos periféricos, medula espinhal e cérebro e a nociplástica – aquela que acontece apesar de não haver evidência clara de dano tecidual real ou ameaça de lesão. Assim, a dor crônica pode estar presente em animais que sofreram lesões traumáticas por pancadas, atropelamentos, fraturas, amputações, calor ou frio extremo, queimaduras químicas, interrupções do fluxo sanguíneo, bem como diante da presença de tumores, tratamento de quimioterapia, diabetes mellitus, que podem afetar animais de todas as idades. 

No entanto, animais idosos encontram-se particularmente suscetíveis à dor crônica, em decorrência da presença de doenças da coluna vertebral, como doença do disco intervertebral e espondilose, luxações do quadril e do cotovelo, osteoartrite, síndrome da cauda equina, afecções orais crônicas, dor oncológica e por tratamento com quimioterápicos, neuropatias e estados de estresse persistente. Por tanto, a avalição da presença e nível de dor em animais idosos, precisam ser feitos, além do controle da causa ou condição primária, uma vez que esta pode ser negligenciada ou subestimada, em prejuízo da saúde e bem-estar de animais idosos.

Pet Med – De que forma a dor pode modificar o comportamento, a mobilidade ou até o humor do animal?

Álvaro José Chávez Silva – Humanos e animais não humanos, particularmente cães e gatos, compartilhamos de algumas estruturas nervosas associadas ao processamento da dor, o que, apoiado pela ciência, nos permite extrapolar alguns componentes da experiência dolorosa. Se lembrarmos ou imaginarmos o desconforto sentido pela presença constante e insidiosa de uma dor que nos acompanha há muito tempo, não seria difícil empatizar com a dor dos animais, e traríamos a nossa mente como esses estados persistentes de dor podem alterar nossa capacidade de lidar com atividades cotidianas como, sentar-se, levantar-se, deitar-se, comer, caminhar, ler, trabalhar, ou até mesmo ver luz e escutar sons. 

Pessoas com dor crônica relatam uma perda do prazer de viver, de interagir socialmente, ir à rua ou sustentar uma conversa com pessoas amadas. Se considerarmos que a dor crônica tem a capacidade de alterar a estrutura e funcionamento de neurônios periféricos, da medula espinhal, mas também do cérebro, poderíamos dimensionar o impacto que a dor pode ter em regiões do cérebro associadas à regulação das emoções, modulação e percepção da dor, devido à hiperexcitabilidade e sensibilização, modificando a forma como os animais percebem e respondem ao seu ambiente. Essas alterações podem resultar numa percepção da dor aumentada, numa modulação da dor deficiente e num maior componente emocional associada à dor, como ansiedade, medo, depressão. O desempenho de atividades físicas pode ainda estar limitada, não apenas pela presença da dor em si mesma, mas pela diminuição da motivação em fazer atividades físicas, como consequência de estados emocionais negativos, o que contribui a um ciclo vicioso de inatividade, persistência da dor e apatia ou depressão. 

O aparecimento de comportamentos indesejáveis não é uma rareza em animais que experimentam dor. Condutas destrutivas, como mecanismo de compensação da dor, eliminação inadequada, agressividade, apatia, isolamento, ansiedade, entre outras, são alguns exemplos de consequências da presença de dor crônica não tratada em cães e gatos.

Pet Med – Quais são os recursos atuais mais eficazes para o controle da dor crônica em pequenos animais?

Álvaro José Chávez Silva – Para podermos oferecer uma melhora significativa na experiência de dor e na qualidade de vida aos nossos pets, precisamos fazer uso de todas as alternativas ou modalidades terapêuticas possíveis e ao nosso alcance, desde que baseadas em evidência, com respaldo científico e prescritas por profissionais da área. Embora o uso de terapia farmacológica seja muitas vezes a primeira opção que nos vêm à mente, quando se trata de dor, algumas abordagens devem ser evitadas. A monoterapia, que se vale do uso de um único tratamento, está cada vez mais em desuso, pelas limitações que esta comporta. Por exemplo, perda do efeito terapêutico, necessidade de incremento da dose administrada para atingir o efeito desejado e aparecimento de efeitos adversos. Assim, o uso de terapias multimodais passa a ser mais adequado para o controle da dor crônica em cães e gatos, desde que prescritos e avaliados por médico veterinário qualificado.

Juntamente à abordagem farmacológica, devem ser incorporadas medidas que permitam a modificação e enriquecimento do ambiente, que promovam a redução do estresse e que permitam auxiliar aos pets na manutenção da funcionalidade e autonomia de movimentação, para uma melhora da qualidade de vida. Evidências corroboram com os inúmeros efeitos benéficos de manter a atividade física, de acordo com as capacidades e limitações dos animais, de uma alimentação adequada e balanceada e da relevância do sono qualidade em indivíduos com condições dolorosas crônicas. 

Terapias complementares e alternativas (TCA) como cinesioterapia, terapias térmicas, laserterapia, eletroterapia, hidroterapia, magnetoterapia, oxigenioterapia hiperbárica, ozonoterapia, acupuntura, moxabustão, massoterapia e osteopatia, entre outras, são algumas das opções não-farmacológicas que podem contribuir na redução da dor nos nossos pets. Adicionalmente, dietas terapêuticas e suplementos anti-inflamatórios, antioxidantes, condroprotetores, desde que prescritos por um médico veterinário qualificado, assim como controle do peso, crucial para promover estados corporais adequados e evitar sobrecargas articulares, também podem ser estratégias terapêuticas que contribuem de forma relevante na melhora da qualidade de vida de animais em condições de dor crônica.

Pet Med – O que é analgesia multimodal e em que casos ela é recomendada?

Álvaro José Chávez Silva – Quando nos referimos à analgesia multimodal, fazemos referência ao uso de mais de uma estratégia terapêutica. A complexidade da natureza da dor crônica, que age por diferentes mecanismos moleculares, em diversas estruturas do sistema nervoso, torna muitas vezes, infrutífero ou limitado o alcance a partir do uso de terapias únicas, por exemplo, um único tipo de analgésico ou anti-inflamatório. A terapia multimodal visa atacar a dor em diferentes pontos do sistema nervoso e influenciar os vários fatores que contribuem para a experiência dolorosa. Os principais objetivos de terapia multimodal são permitir um melhor controle da dor, fazer uso de doses reduzidas de cada medicamento utilizado, potenciando efeitos benéficos sinérgicos ou aditivos e reduzindo o risco de efeitos adversos ou colaterais decorrentes do uso de doses mais altas de um único medicamento. Também, consideramos terapia multimodal a incorporação de terapias farmacológicas junto a terapias não-farmacológicas, como as mencionadas anteriormente.

Pet Med – Além de medicamentos, que medidas ambientais e de manejo podem ajudar animais com dor crônica?

Álvaro José Chávez Silva – Além das terapias medicamentosas, como analgésicos, anti-inflamatórios, anticonvulsivantes, antidepressivos etc., existem medidas ambientais e de manejo que possibilitam uma melhora na qualidade de vida de pets com dor crônica. Tais medidas dependerão do tipo específico de dor crônica, o tempo que o animal convive com a dor, as limitações que a dor tem-lhe causado em termos de mobilidade e autonomia, e da identificação dos gatilhos da dor. 

Oferecer camas confortáveis ou ortopédicas que aliviem a pressão sobre áreas dolorosas; superfícies seguras e antiderrapantes para evitar escorregões ou quedas; rampas ou escadas adequadas para facilitar o acesso a locais elevados como sofás, camas, carros, para reduzir o estresse nas articulações; bandejas sanitárias de fácil acesso para os gatos com laterais baixas para facilitar a entrada e saída da caixa, especialmente para gatos com problemas articulares; tigelas de comida e água elevadas ou acessíveis para animais com dores no pescoço o coluna, para reduzir a necessidade de se curvarem, diminuindo o desconforto; zonas de descanso seguras e tranquilas onde possam descansar sem ser perturbados, permitindo um sono reparador, essencial para o bem-estar e para lidar com a dor; manter a temperatura adequada dos locais que o animal frequenta, evitando temperaturas de extremo frio ou calor que possam agravar a dor em alguns animais, ou oferecendo cobertores aquecidos o mantas térmicas, sempre com supervisão; evitar estímulos aversivos como sons altos, abruptos, movimentos bruscos, ou outros estímulos estressantes que possam gerar ansiedade no animal. 

Visitas regulares ao médico veterinário são de extrema importância para poder fazer avaliações do estado geral do pet, com ênfase na resposta aos tratamentos realizados, podendo, às vezes, ser necessários ajustes nas modalidades e doses terapêuticas, controle do peso, indicações de sessões de fisioterapia ou reabilitação.  

Vale ressaltar a grande importância da interação e o vínculo do tutor com o seu pet, que devem ser sempre gentis prodigando amor e afeto, respeitando as limitações do animal. Os familiares devem ser pacientes para reduzir o nível de ansiedade do animal, gerando um ambiente acolhedor e seguro, onde possam se sentir à vontade. Não devemos subestimar o efeito reparador do amor como forma de suporte essencial para o bem-estar e a resiliência e como um componente fundamental do manejo humanizado da dor em cães e gatos.

Pet Med – Como o ambiente, a rotina e os cuidados diários podem influenciar positivamente na dor de longo prazo?

Álvaro José Chávez Silva – O ambiente, a rotina e os cuidados diários têm um impacto significativo no manejo da dor de longo prazo em animais, influenciando tanto a experiência individual da dor quanto o bem-estar geral dos nossos pets. Quando otimizados, podem reduzir a intensidade do desconforto e o sofrimento emocional, aumentar o prazer pela realização de atividades lúdicas ou rotineiras e a interação social, tanto recebendo como oferecendo afeto aos membros da família. 

O cuidado atento dos fatores ambientais, a rotina e os cuidados diários podem melhorar significativamente a qualidade de vida e até mesmo diminuir a necessidade de altas doses de medicamentos, particularmente relevantes em animais idosos. 

Em resumo, um ambiente enriquecido e adaptado, uma rotina previsível e consistente, e cuidados diários atenciosos e personalizados são pilares fundamentais no manejo da dor de longo prazo em animais. Essas medidas não apenas complementam os tratamentos médicos, mas também promovem o bem-estar físico e emocional, contribuindo significativamente para uma melhor qualidade de vida, ao passo que fortalecem o vínculo afetivo entre o animal e o tutor. Embora o fortalecimento do laço afetivo entre tutores e animais seja visto de forma positiva, por vezes, este mesmo vínculo e a empatia pelo sofrimento do animal pode ser uma fonte de sofrimento para o tutor, pela observação e entendimento do estado do seu pet. Desta forma, níveis reduzidos de dor e sofrimento, e estados emocionais positivos, podem também ser fonte importante de tranquilidade para os tutores de animais que convivem com condições dolorosas crônicas.

Pet Med – É comum a dor crônica ser confundida com envelhecimento ou mudanças de temperamento? 

Álvaro José Chávez Silva – Sim, é muito comum a dor crônica e o envelhecimento ou mudança de comportamento serem confundidas entre si, devido ao aparecimento sutil e gradual dos sinais de dor, à incapacidade de autorrelato dos animais e às características da dor crônica, descritas como sensação de queimação, formigamento, choque elétrico, agulhadas, pontadas, peso ou pressão, rigidez, difusa ou mal localizada, câimbras ou espasmos musculares, entre outras, podemos imaginar que os animais possam, por um lado, mascar alguns comportamentos de forma consciente ou inconscientemente, pela diminuição da qualidade, quantidade e amplitude da mobilidade ou, por outro lado, apresentar comportamentos inusuais, indesejáveis, destrutivos, auto destrutivos, agressivos ou ansiosos como mecanismos de compensação ou expressão da dor. Estas manifestações podem variar significativamente entre indivíduo, dependendo da causa subjacente e da personalidade e temperamento do animal, chegando em alguns casos a ser limitante ou incapacitante.

Desta forma, animais idosos com menos energia, mobilidade reduzida, maiores tempos de descanso ou sono e alterações no humor e problemas de comportamento, podem ser mal interpretados como apenas velhos, o que seria esperado diante do processo normal de envelhecimento, quando na verdade, podemos estar diante de possíveis sobreposições de sinais de dor e envelhecimento. Independente da cronologia do aparecimento ou da causalidade, a dor deve ser tratada de acordo com as circunstâncias do animal.

A incompreensão e mal interpretação destes comportamentos ou sinais de dor, pode ser fonte de frustração do proprietário levando a negligenciar a dor e o sofrimento do animal, podendo gerar ruptura do vínculo afetivo, maus tratos, abandono e no pior dos casos à eutanásia, embora pouco frequente no Brasil. Por tanto, é imprescindível fazer uma correta diferenciação de forma atenta e holística, considerando múltiplos fatores. 

A dor crônica pode estar melhor representada pela redução específica de atividades como subir e descer escadas, saltar, brincar, passear, enfim, atividades que antes eram prazerosas, mudanças na marcha com rigidez após o descanso que melhora com o movimento leve, claudicação intermitente ou constante ou passos mais curtos, posturas anormais, curvadas, cabeça baixa e transferência de peso, irritabilidade ao ser tocado em certas áreas, evitar carícias ou manipulação, dificuldade em encontrar uma posição confortável, sono interrompido; lambedura excessiva, focada em uma área específica do corpo; gemidos ou choros ocasionais ao se mover. Por sua vez, o envelhecimento, pode se apresentar como uma diminuição geral da energia e da velocidade, com lentidão mais generalizada, sem evitar atividades específicas devido à dor. Pode haver alguma rigidez matinal, que geralmente melhora rapidamente com o movimento, menor interesse em atividades de alta intensidade, mas ainda participa de atividades mais leves. Outro fator a considerar na diferenciação entre dor crônica e envelhecimento é baseado na função física. Na dor crônica, haverão limitações específicas na amplitude de movimento, dificuldade em realizar movimentos que exigem flexão ou extensão de certas articulações, enquanto que no envelhecimento pode haver diminuição geral da flexibilidade e da força, mas sem dor óbvia associada ao movimento. A resposta a analgésicos (teste terapêutico), pode ser uma ferramenta valiosa na diferenciação entre dor crônica e envelhecimento, uma vez que uma melhora significativa no nível de atividade, humor e mobilidade após a administração de analgésicos devidamente prescritos pelo veterinário sugere fortemente a presença de dor e diante de envelhecimento ou mudanças de temperamento, geralmente, não há melhora significativa com analgésicos.

Pet Med – Que mensagem você deixaria para tutores que acreditam que “ficar mais quieto” é apenas sinal de envelhecimento, e não de dor?

Álvaro José Chávez Silva – Eu gosto de pensar que realizar atividade física é uma forma de envelhecer com dignidade, não para evitar ficar velho. Ficar mais quieto não deveria ser uma atitude ou um comportamento normalizado associado ao envelhecimento nem em nós humanos, nem nos nossos pets. Ainda que velhos, humanos e animais, e porque não juntos, deveríamos evitar “ficar mais quietos”. Se ao tentarmos induzir a atividade física em nossos pets, percebermos que há desconforto, relutância ou ausência do desfrute da atividade, atenção! Talvez seja hora de procurar o médico veterinário, para avaliar a presença de dor crônica. Infelizmente, não há uma cura única e exclusiva ou um tratamento milagroso para a dor crônica. Ao invés de cura, tratamos de buscar maneiras de oferecer aos nossos pets uma melhora significativa da sua qualidade de vida, de forma que possam viver com dignidade e sejam capazes de receber ou oferecer amor, tendo o prazer de experienciar a vida com mais tempos de alegria que de angústia.

Pet Med – Para os cães com diagnóstico de dor crônica, de que modo o uso de suportes como os protetores de membros e o colete Calm Pet da Pet Med, podem ajudar a proporcionar a eles uma melhor qualidade de vida e longevidade?  

Álvaro José Chávez Silva – Ao se tratar destas questões relevantes sobre o manejo da dor crônica, é importante salientar a necessidade do uso de abordagens terapêuticas embasadas em evidências científicas sólidas e na individualização do tratamento para cada paciente.

Em relação ao uso de suportes como os protetores de membros da Pet Med para animais com dor crônica, é importante considerar que estes produtos podem desempenhar um papel coadjuvante no manejo da dor, especialmente em casos específicos. Em situações onde a dor crônica está associada a problemas articulares, calos de apoio ou higromas, os protetores podem oferecer proteção mecânica e suporte adicional. Ao reduzir o atrito, a pressão e o impacto sobre as áreas afetadas, eles podem auxiliar na manutenção da mobilidade e reduzir a dor induzida pelo contato.No entanto, é crucial ressaltar que a eficácia destes suportes dependerá da etiologia específica da dor crônica, da localização e da extensão das lesões, e devem ser integrados a um plano de manejo mais amplo, que pode incluir farmacoterapia, fisioterapia e outras abordagens.

No que concerne ao Calm Pet e seu papel em animais com alterações de comportamento devido à dor crônica, é fundamental entender que a dor persistente pode gerar ansiedade, irritabilidade e alterações no padrão de sono, impactando significativamente o bem-estar emocional do animal. Coletes de compressão como o Calm Pet, baseados no princípio da pressão profunda, podem teoricamente promover uma sensação de segurança e calma em alguns animais, através da estimulação do sistema nervoso parassimpático. Contudo, assim como os suportes de membros, a sua eficácia provavelmente variará significativamente entre indivíduos, dependendo da causa subjacente da dor, da intensidade do desconforto e da natureza específica das alterações comportamentais. É essencial considerar os produtos como uma ferramenta complementar dentro de uma estratégia de manejo comportamental mais abrangente, que pode envolver a identificação e o tratamento da causa primária da dor, modificação ambiental, técnicas de dessensibilização e, em alguns casos, intervenções farmacológicas específicas para o comportamento.

Em ambos os cenários, a avaliação clínica individualizada e a compreensão da etiologia e da apresentação específica da dor crônica em cada paciente são pilares fundamentais para determinar a aplicabilidade e o potencial benefício destes produtos. A decisão de incorporar suportes de membros ou o Calm Pet no plano de tratamento deve ser baseada em avaliações clínicas criteriosas e na observação da resposta individual de cada animal, sempre considerando a sua integração com outras modalidades terapêuticas comprovadamente eficazes no manejo da dor crônica.

Pet Med – Por fim, quais são suas considerações finais para os nossos leitores?

Álvaro José Chávez Silva – A abordagem terapêutica da dor deve ser humana e realista. Fazer uso dos conhecimentos mais recentes, consistentes e baseados em evidência científica é importante para encontrar aquelas terapias que melhor se adaptam ao contexto do animal e à realidade do tutor. Oferecer soluções esdrúxulas, excessivamente otimistas com promessas de cura, não são apenas irreais, mas também injustas e antiéticas com os tutores, e correm risco de negligenciar outras terapias que poderiam oferecer melhor resultado no tratamento. Finalmente, o tratamento da dor deve ser multimodal, holístico e sensível. Entender e tratar a dor em animais é um alto sinal de evolução humana, indica amor e compaixão pelos mais vulneráveis, aqueles que nos têm sido confiados e sem interesse egoísta nos oferecem o seu amor.

Siga a Pet Med no Instagram:

  • Dicas de saúde e bem-estar 🐾
  • Produtos incríveis para todas as necessidades 🐶🐱
  • Linha Vet com coleções exclusivas para quem cuida do seu melhor amigo com conforto e estilo. 👩‍⚕️👨‍⚕️
  • Inspiração para você e seu melhor amigo 🥰

Compartilhe seus momentos especiais com a #petmed e inspire outros apaixonados por pets!

Conforto e proteção? A Pet Med tem!

  • Tecnologias Dry, Antimicrobiana e UV 50+ ✨
  • Roupas protetoras e protetores anatômicos 🐶🐱
  • Tecido leve e flexível para o máximo de bem-estar 😊

Seu pet merece o melhor! Descubra nossa linha completa de produtos.

#PetMed #AmorPet #BemEstarAnimal